sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Violência no Rio de Janeiro


Diante de toda a situação em que se encontra o Rio de Janeiro, é preciso esclarecer diversas coisas. A começar pelo fato de muitas pessoas dizerem que “estamos à beira de uma guerra civil” – não meus caros. Estamos de fato em uma guerra civil. Nos falta apenas que nossas autoridades declarem publicamente estado de guerra – o que não farão de modo algum. O interesse no sucesso da Fifa World Cup 2014 e Jogos Olímpicos 2016 são maiores do que o valor à qualquer vida a menos.

A chegada destas informações à mídia internacional causa desespero às autoridades brasileiras. Por falar em desespero, como não citar o verdadeiro pânico provocado pela mídia? Eu, particularmente, desligo a TV. Não compro violência. Flashes a cada cinco minutos, e um verdadeiro show ao vivo com as perseguições e operações policiais, são além de desnecessários, burros. A mídia sem dúvida atrapalha no sucesso das operações policiais – não que eu concorde com a forma que a polícia militar age no Rio de Janeiro.

Ouço muita gente dizer que a polícia está corrompida por completo, são todos bandidos e etc etc etc. Concordo em parte. Nossos policiais de fato não são exemplo de conduta. Mas já parou para se perguntar o porque? Ganhar mil reais por mês para arriscar a vida, deixar sua família em casa para subir um morro, participar de ações perigosíssimas, sem garantias, e sem o devido preparo físico, tático e psicológico para tal. Mil reais foi o que pagou o governador Sérgio Cabral para quem segurava suas placas de campanha em 2010. Foi esse homem – e mais, esse projeto de estado, que se reelegeu com mais de 60% dos votos dos cariocas. Parabéns.

A onda de ataques chegou finalmente ao asfalto, e causa todo esse rebuliço que estamos vivemos. Quem não sabia que isso, um dia, iria acontecer? Quem acreditou que as UPP’s seriam a ‘salvação’? Por falar em UPP, não acredito de forma alguma que sejam a causa dos ataques. Muitos acreditam que as três facções que se juntaram, o fizeram para agir em repúdio às UPP’s. Caros, que UPP impede alguém de subir em uma comunidade para comprar droga? No início da implantação das Unidades de Polícia Pacificadora no Rio, um comandante da polícia deu a seguinte declaração: “Com as UPP’S, nós não iremos acabar com o tráfico de drogas. Iremos apenas acabar com essa história de traficante desfilando de fuzil na mão.”

O Fato, é que estamos passando pelo que passam os moradores das mais de 300 comunidades cariocas, todos os dias. Viver a vida apreensivo, com medo. Assim vivem as milhares de pessoas, que são na maioria das vezes, obrigadas a estar à margem da sociedade. Estatisticamente, menos de 2% dos moradores das favelas estão envolvidos no tráfico. Pagam com suas vidas, por algo que não lhes pertence. Essas pessoas convivem com a violência desenfreada, diariamente. Me dói saber que é preciso derramar sangue para que a sociedade abra os olhos, e comece a pensar e discutir sobre a questão da segurança pública no Rio de Janeiro, mas me agrada saber que é chegada a hora de discutirmos.

Os cariocas estão seguindo um caminho de buscar os culpados. Pois bem. Citando Rousseau, digo que “O Estado somos todos nós.” A culpa de tudo isso é de TODOS NÓS.

O dever de boa educação, de boa administração, de controle, de desigualdade, de pobreza é tão nosso quanto do Estado. Se esperar que o Estado resolva tudo, e achar que você está certo porque ‘não consome droga e paga seus impostos’ é isso que vai continuar acontecendo: passaremos por cima da violência e só nos lembraremos dela quando bater à nossa porta. Assumir nossa responsabilidade de cidadão ATIVO é o que tem que ser feito. Definição de ser cidadão = pagar meus impostos ficou, pra mim, no passado.

Há os que defendem ainda, que a culpa é dos usuários de droga. Acho que tá na hora de amadurecermos essa discussão, e aceitar que as drogas deveriam ser tratadas como um problema de educação e de saúde pública. Além de entender de uma vez por todas, que as drogas não são a ÚNICA causa da violência em nosso estado.

Pânico geral, violência gerando violência. Sobe morro, desce morro, fogo em carro, ônibus, vidas perdidas. Tempo perdido, energia perdida. Noção de cidadania perdida. Não acho que a ocupação dos morros irá resolver, porque nem acho que irão se dar de fato. A polícia não precisa ocupar os morros para dizer, como ontem em entrevista disse um comandante da PM “afirmo que a Vila Cruzeiro está dominada pelo Estado”. É preciso que essa população se sinta parte do Estado, se sinta protegida por ele, com educação, saúde, pão, arte e cultura. Segundo Hobbes, o homem assina o contrato social e doa parte de sua liberdade, para que o Estado o proteja. Acho que não deu certo. Doa-se liberdade, e em troca, perde-se o pouco que restava dela. Vivemos numa situação de segurança ilusória, trancados atrás das grades de nossas casas.

Está mais do que claro que o poder paralelo é mais forte que o poder do Estado.O que gerou o estouro dessa situação foi politicagem, acredito portanto, que será resolvido com politicagem e acordos.

Fácil discutir ocupação ou não dos morros, exército nas ruas em tempos de caos. O que eu espero com tudo isso, é que a população seja radical, segundo o conceito de Marx: vá à raiz do problema. Discuta legalização das drogas, educação da população, sistema econômico. A mídia só cria pânico, não contribui para o debate. Mas nós devemos debater todas essas questões. Termino citando o grande Pensador Gabriel: “MUDA, porque o medo é um modo de fazer censura.”


Isabel Santos

2 comentários:

  1. Disse tudo o que muita gente não consegue enxergar. Que o problema é estrutural e o sistema não funciona como deveria.. Espero que agora seja a hora de mudarmos isso.

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  2. Excelente, Bel. Vou tentar fazer com que mais pessoas leiam esse texto! Brilhante!

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